A Assembleia Legislativa de Santa Catarina acolheu, na sessão plenária de hoje, a representação por crime de responsabilidade que poderá resultar no impeachment do governador Carlos Moisés da Silva (PSL), da vice-governadora Daniela Reinehr (sem partido) e do secretário de Estado da Administração, Jorge Eduardo Tasca. Hoje também os três citados na representação foram notificados do processo.
O ponto central da representação é a concessão de aumento salarial por ato administrativo, em 2019, aos procuradores do Estado, visando à isonomia salarial com os procuradores jurídicos da Assembleia Legislativa.
Ainda durante a sessão, o presidente da Assembleia, deputado Julio Garcia (PSD), leu o despacho no qual acata a denúncia, com base em parecer da Procuradoria Jurídica da Casa e garantiu que o processo vai tramitar de acordo com a lei e com direito de ampla defesa aos acusados.
PROCESSO LEGAL
O deputado Júlio Garcia também se manifestou a respeito de petições apresentadas por Moisés e Daniela, nesta semana, nas quais questionam pontos referentes ao processo de impeachment.
Moisés argumentou que o autor da denúncia poderia estar com os direitos políticos suspensos, em função de ação judicial que tramita contra ele em segredo de Justiça. Além disso, o governador incluiu na petição manifestações do Tribunal de Contas do Estado (TCE), Procuradoria-Geral de Justiça (PGJ) e da 12ª Procuradoria de Justiça da Capital que o isentariam de responsabilidade nos supostos crimes. Já Daniela questionou a sua presença no processo, uma vez que, segundo ela, a legislação na qual a Alesc se baseou para estabelecer o rito do impeachment não trata da figura do vice-governador.
Com base em parecer da Procuradoria Jurídica da Assembleia, Julio Garcia afirmou que o autor da denúncia não está com os direitos políticos suspensos. A respeito das manifestações do TCE e do Ministério Público de Santa Catarina (MPSC), o presidente considerou que as mesmas são relativas ao primeiro pedido de impeachment apresentado em janeiro e não estão relacionadas com a documentação apresentada por Zimmer Junior, em maio, no segundo pedido.
Sobre a presença da vice-governadora, o presidente da Alesc considerou, também com base em parecer da Procuradoria, que a legislação se aplica a Daniela, uma vez que ela teria tomado conhecimento da equiparação salarial dos procuradores do Estado quando estava no comando do Estado, em janeiro. “Não trazer a figura da vice na legislação não retira a legitimidade”, disse. “Do contrário, qualquer ato executado na interinidade do cargo não seria passível de responsabilização.”
DENÚNCIAS GRAVES
Um dos pontos de destaque no despacho lido por Julio Garcia diz respeito a decisões referentes à suspensão do pagamento de valores atrasados aos procuradores do Estado, consequência da equiparação salarial. Em 10 de fevereiro deste ano, o Tribunal de Justiça de Santa Catarina determinou tal suspensão, mas o governo estadual não cumpriu a determinação. A suspensão efetiva do pagamento só ocorreu em maio de 2020, após decisão do Pleno do TCE.
No despacho lido em Plenário, Julio Garcia afirmou que as denúncias apresentadas na representação “são graves e merecem análise criteriosa por esta Casa”. “Neste juízo prévio, não há qualquer condenação. Todos terão a oportunidade de se manifestar”, acrescentou.
O presidente determinou que cópias da denúncia sejam distribuídas a todos os deputados e reiterou que o acatamento, por parte da Presidência da Alesc, está baseado em aspectos jurídicos.
“O processo nessa fase tem apenas características jurídicas e esse é o tratamento que a Presidência dará em toda a sua tramitação. Ele está embasado em teses jurídicas e não políticas, e tramitará com todo o respeito e responsabilidade que o caso requer.”
Conforme o Ato da Mesa 221, de 24 de julho de 2020, que regulamenta o rito do impeachment, uma vez feita a notificação, passa a contar o prazo de dez sessões ordinárias para que Moisés, Daniela e Tasca apresentem suas defesas ao Parlamento catarinense. Tanto o despacho do presidente quanto a denúncia lida por Schuster serão publicados no Diário Oficial da Assembleia.
AS DENÚNCIAS
Na representação, o defensor público Ralf Zimmer Junior afirma que o reajuste salarial dos procuradores do Estado, autorizado em outubro do ano passado pelo governador e com anuência do secretário da Administração, foi concedido por meio de procedimento administrativo sigiloso e fraudulento, com o objetivo de “driblar” os instrumentos de controle e fiscalização, sem a devida autorização por meio de lei aprovada pela Assembleia o que, na avaliação do denunciante, causa prejuízo de aproximadamente R$ 800 mil mensais aos cofres públicos, além do pagamento de atrasados que chegaram a quase R$ 8 milhões. Na reapresentação da denúncia, em maio, ele anexou decisões do Tribunal de Contas do Estado (TCE) e do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) que comprovariam suas argumentações.
Zimmer Junior cita que Moisés vetou emenda parlamentar que concederia a mesma equiparação salarial, proposta pela Assembleia durante a discussão da Reforma Administrativa, em 2019, sob a argumentação de aumento de despesa não estimada pelo Poder Executivo. Além disso, a decisão judicial citada pelo Executivo para conceder a equiparação não beneficiaria os procuradores que à época não eram filiados à associação que ingressou com a ação judicial, conforme jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF).
Para o defensor, Moisés e Tasca, por terem assinado o ato que concedeu o reajuste, têm responsabilidade pela suposta ilegalidade. Já a vice-governadora, na visão de Zimmer Junior, teve conhecimento do reajuste, quando assumiu o comando do Estado em janeiro deste ano, foi conivente ao “encampar o ato ilícito” e não suspender o pagamento do aumento e abrir sindicância para investigar o caso, por isso “omitiu-se dolosamente”.
O autor da denúncia também considera que os três citados reconheceram a ilegalidade nas respostas que apresentaram à Assembleia quando da apresentação da denúncia, ainda em janeiro. O defensor acrescenta, ainda, que Moisés concedeu entrevistas sobre a questão, o que configuraria novamente o reconhecimento dos crimes supostamente praticados.
“Os representados em questão atentaram contra o livre exercício do Poder Legislativo, contra a probidade na administração pública, a lei orçamentária e o cumprimento correto das leis e decisões judiciais, incidido nos crimes de responsabilidade produzidos no artigo 72 da Constituição do Estado de Santa Catarina”, diz o denunciante, em um dos pontos da representação.