A greve dos caminhoneiros que paralisou o Brasil no final de maio deixou exposta a dependência do país em relação aos combustíveis. Os motoristas cruzaram os braços em protesto contra o preço elevado do diesel, e produtos que chegam às cidades pela estrada deixaram de ser entregues, incluindo gasolina, álcool e diesel. Sem combustíveis nas bombas, donos de carro ficaram a pé.
Houve quem conseguisse atravessar ileso a crise de desabastecimento. Os brasileiros que têm carro elétrico não tiveram que enfrentar as filas quilométricas nos postos de gasolina. Seus motores funcionam graças à energia armazenada em baterias que se recarregam pela tomada, sem precisar de nenhuma gota de combustível.
Os donos de carro híbrido, por sua vez, sofreram relativamente pouco. Esses veículos rodam pela força de dois motores: um movido a combustível e o outro, a eletricidade. Não há necessidade de tomada. A energia produzida todas as vezes que se freia o carro é guardada numa bateria. O motor elétrico, alimentado por essa bateria, permite que o motor tradicional permaneça desligado durante parte do trajeto. Com 1 litro de gasolina, os híbridos conseguem percorrer, em média, 20 quilômetros — o dobro dos carros comuns.
Foram, porém, bem poucos os que escaparam da crise de maio. Nas ruas do Brasil, os veículos com a nova tecnologia não chegam sequer ao papel de coadjuvantes. São meros figurantes. De quase 1,9 milhão de carros novos emplacados no país no ano passado, em torno de 3 mil eram elétricos ou híbridos — menos de 0,2% do total. Segundo o governo, há 8 mil unidades do tipo em circulação.
Apesar do rótulo de novidade, faz duas décadas que o motor elétrico chegou ao mercado. O híbrido Toyota Prius foi lançado no Japão em 1997. Na Noruega, quase 30% dos veículos já são elétricos ou híbridos. Na Holanda e na Suécia, perto de 6,5% e 3,5%, respectivamente. No gigantesco mercado da China, 1,5% da frota está nessa categoria — nada menos do que 450 mil veículos.
O atraso do Brasil tem explicação: os carros elétricos e híbridos são vendidos no país a preços muito altos, o que assusta os compradores e impede a popularização. A versão híbrida do Ford Fusion e o elétrico BMW i3 custam a partir de R$ 160 mil. O Prius mais barato sai por R$ 130 mil. Como comparação, pode-se comprar um veículo 1.0, com motor a combustão, por menos de R$ 30 mil.
— Os países que decolaram na adoção dos veículos elétricos e híbridos só tiveram sucesso porque os governos concederam uma série de incentivos, como benefícios tributários, liberação de pagamento de pedágios, estacionamentos gratuitos etc. No Brasil, isso ainda não aconteceu — explica o presidente da Associação Brasileira do Veículo Elétrico (ABVE), Ricardo Guggisberg.
A grande queixa dos empresários é o peso dos tributos que recai sobre esses veículos. O Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) incidente sobre um carro elétrico é de 25%. Sobre um híbrido, 13%. São bem mais altos do que o IPI de um carro popular, que tem alíquota de 7%. A indústria defende que o imposto de ambos os modelos também seja de 7%. Nessa hipótese, o Prius, por exemplo, ficaria cerca de R$ 10 mil mais barato para o comprador.
O Senado estuda uma série de projetos de lei que buscam baratear esses veículos. Entre eles, estão o PLS 415/2012, de Eduardo Amorim (PSDB-SE), o PLS 174/2014, de Eduardo Braga (MDB-AM), o PLS 780/2015, de Jorge Viana (PT-AC), e o PLS 340/2016, de Telmário Mota (PTB-RR), que fazem mudanças no IPI.
Em outra frente, o PLS 337/2014, de Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM), permite que os carros híbridos passem a ser produzidos na Zona Franca de Manaus fazendo jus aos mesmo incentivos fiscais já concedidos às indústrias da cidade.
O Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços chegou a avisar que as alíquotas de 25% e 13% cairiam para 7% em janeiro passado. O prazo prometido passou, e os percentuais não baixaram até hoje. O entrave é o Ministério da Fazenda, que oferece resistência à criação de medidas que reduzam os impostos arrecadados. Procurada pela reportagem, a Fazenda afirmou que a discussão a respeito de incentivos aos carros híbridos e elétricos está “bem próxima do fim”.
— Considerar a perda de arrecadação é uma visão imediatista, que não olha para o futuro. Esse atraso vai deixar a nossa indústria automotiva sucateada, inclusive a de peças para a montagem dos veículos híbridos e elétricos — critica Guggisberg, da ABVE.
Além de permitir que as pessoas dispensem a gasolina ou pelo menos fiquem menos dependentes dela, os novos carros têm a vantagem de não colaborarem com a poluição sonora (são muito mais silenciosos que os veículos convencionais) e com a degradação atmosférica (emitem pouca ou nenhuma fumaça). Contribuem, portanto, para garantir aos cidadãos o disposto no artigo 225 da Constituição, que eles outorga o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, essencial à saúde. A tecnologia elétrica também pode ser adaptada aos ônibus e aos caminhões, o que amplia o benefício ambiental.
É justamente no setor de ônibus, e também de caminhões de pequeno porte, que a indústria nacional está se desenvolvendo, já que os modelos de passeio são todos importados, com taxa zero de Imposto de Importação, segundo a ABVE. O que está andando lentamente é a substituição das frotas do transporte público urbano, de acordo com Guggisberg.
(Fonte: Agência Senado/Ricardo Westin)